Qual é a ideia?

A proposta é criar um museu digital que assuma o compromisso de apresentar e discutir a diversidade de aspectos das culturas digitais para comunidades falantes da língua portuguesa.

Observamos que a maior parte do conteúdo sobre a cibercultura está disponível em língua inglesa, o que dificulta o acesso das comunidades lusófonas a uma participação mais densa nas discussões desta área. Essa dificuldade de acesso gera um efeito negativo: pessoas que não dominam a língua inglesa acabam se relacionando com as tecnologias digitais somente nas camadas mais superficiais das estruturas de comunicação.

As posições nesse contexto são bem definidas: 1) a das grandes empresas que criam e oferecem serviços digitais, modelando os cenários em que os usuários interagem e predizendo/prescrevendo seus comportamentos; 2) profissionais desenvolvedores de tecnologias, que muitas vezes trabalham para as big techs em funções alienadas, contribuindo em partes dos projetos, sem condições (e às vezes sem interesse) de observar o todo; 3) usuários finais, que são as pessoas que utilizam os programas nas camadas mais superficiais, que se apropriam das tecnologias em seus cotidianos e acabam por estabelecer relações de subalternidade e dependência em relação às empresas que ofertam os produtos e serviços. Esse grupo tem uma particularidade interessante, porque muitas vezes ele é composto por pessoas que são engajadas e críticas em suas áreas de atuação, mas que parecem ser impermeáveis à elaboração de reflexões críticas e ações de combate às práticas colonialistas por meios eletrônicos.

Há, evidentemente, um quarto grupo, que corresponde à resistência. Ele é formado por pessoas e comunidades que conseguem identificar a ideologia que subjaz às práticas das big techs. Torna-se assim possível atuar nas arenas de disputas políticas denunciando os programas de colonização digital e propondo alternativas para o estabelecimento de relações mais satisfatórias e autônomas com as tecnologias. O maior ponto de convergência entre as pessoas que interagem nesta resistência é o desenvolvimento, uso e debate sobre software livre. A proposta do cibermuseu surge e encontra sentido neste movimento de resistência.

Certamente compreendemos que a questão da língua não é o único obstáculo para a maior apropriação das comunidades lusófonas em relação às culturas digitais. Entretanto, observamos que esse fator pode ser decisivo para ampliar a alienação de muitos grupos sociais em relação ao conhecimento das tecnologias de informação, para impedir uma reflexão crítica que leve ao reconhecimento das relações de poder que interagem nesses contextos e para esconder ou naturalizar as estratégias de manipulação das subjetividades que frequentemente são empregadas no sentido de submeter povos inteiros a interesses coloniais.

Se a história e os contextos de produção das tecnologias não estão acessíveis, é realmente muito difícil para que as pessoas que utilizam esses recursos possam desenvolver pensamentos críticos sobre as ideologias que interagem nesses campos de batalha. As tensões se apagam, é como se não houvesse disputa. As tecnologias surgem então quase como dádivas nesse imaginário marcado pela alienação. Nesse sentido, acreditamos que o Cibermuseu pode colaborar para estimular o acesso de um grande público (particularmente comunidades escolares) a questões que surgem com tanta urgência em nossa sociedade.

Por que um museu?

Na próxima página identificamos as possíveis contribuições que um museu das culturas digitais pode oferecer para estimular a participação das comunidades lusófonas no debate sobre as culturas digitais.