Normativas

A alta credibilidade dos museus está vinculada ao fato dessas entidades preservarem referências que, em conjunto, são capazes de criar representações da sociedade. Isso possibilita uma quebra no ritmo da experiência cotidiana, uma oportunidade de observar a realidade a certa distância, com algum grau de objetividade. Fica claro que nesse sentido museus constituem arenas de disputa de significados e narrativas, uma vez que esse modo de representar gera impacto e influência na sociedade.

Nesse sentido é necessário colocar em questão que, embora forças diferentes se tensionem no âmbito dos museus, o principal compromisso dessas instituições é com o desenvolvimento da sociedade a longo prazo. As normas produzidas tanto no Brasil como em convenções internacionais ressaltam a função social dos museus e buscam prever mecanismos para estimular a representação de perspectivas diversas, contemplando narrativas produzidas por grupos minoritários.

O Centro de Documentação e Informação da Câmara dos Deputados do Brasil publicou em 2017 uma reunião significativa das normas sobre museus (acesse aqui). Destacamos nesse conjunto dois documentos importantes para a criação do Cibermuseu: o Código de Ética do Icom para Museus (2001) e a Lei 11.904 (2009), que institui o Estatuto dos Museus. Ambos os textos indicam cuidados necessários com a preservação de bens materiais, algo que não nos diz respeito diretamente. Entretanto, há também orientações sobre o planejamento e gestão de museus em função de seus compromissos com a sociedade, perpassando evidentemente as áreas de documentação, conservação e comunicação.

Uma das orientações importantes no sentido do planejamento é a previsão de que o museu estabeleça um documento denominado plano museológico. Este documento deve apresentar o museu à sociedade, mostrando sua missão e funções específicas, bem como a tipologia de acervo, meios para sua preservação, descrição de públicos, estratégias de sustentabilidade, detalhamento de programas etc.

O ponto nevrálgico para o planejamento estratégico de um museu que está sendo criado do zero certamente é a política de aquisição de acervo. A definição desta política vai orientar todos os outros trabalhos, e é sobre uma proposta de reunião de acervo que trataremos a seguir.

Proposta de política de aquisição de acervo

A política de aquisição está diretamente relacionada à missão e aos objetivos do museu. A pergunta é: o que deve ser preservado para que a instituição possa criar uma representação adequada das culturas digitais? O Cibermuseu, ao menos a princípio, será um museu de objetos digitais, o que significa dizer que em primeira instância esses objetos são constituídos por códigos. São, portanto, objetos reprodutíveis, e isso determina nosso contexto de atuação.

O primeiro desafio é a definição de critérios para selecionar os objetos digitais que comporão as coleções. Observamos que há um risco do museu se perder em uma quantidade imensa de materiais disponíveis com potencial para serem musealizados. Nesse caso, a estratégia que propomos é a seguinte:

  1. Assumir que todo o conteúdo preservado pelo Cibermuseu estará disponibilizado sob algum tipo de licença copyleft ou em domínio público.

A princípio essa regra nos parece importante porque evitará conflitos sobre direitos de propriedade intelectual, bem como permitirá que todo o conteúdo possa ser apropriado pelo público conforme as condições da licença específica de cada objeto. Por outro lado, pairam muitas dúvidas sobre esse terreno das licenças, de modo que cada caso merecerá um esforço de análise particular.

Cabe assumir também uma política de descarte, segundo a qual descartaremos os objetos cuja propriedade intelectual for reclamada por terceiros.

  1. Definir categorias de acervos e formas de aquisição. Supomos aqui três categorias:
    • Referências sobre culturas digitais: todo tipo de objeto digital (imagens, vídeos, textos, códigos fonte, sistemas operacionais, softwares em geral, jogos, páginas web etc.) que possa ser representativo de nichos das culturas digitais. Tais objetos serão organizados em coleções temáticas. Para evitar uma cruzada em busca de objetos, propomos que eles passem a integrar o acervo na medida em que fizerem parte de uma exposição – integrar uma exposição seria o critério para a musealização do bem cultural.

      Lembramos ainda que alguns desses objetos poderão ser criados especificamente para exposições, como por exemplo o depoimento de uma pessoa que participou de/testemunhou um determinado evento representado na exposição;
    • Memória institucional: se enquadra nesta categoria todo tipo de objeto que represente a memória institucional do Cibermuseu. Não é necessário que esta categoria seja disponibilizada para o público. No futuro deverá ser estabelecido um critério para determinar o que é relevante;
    • Soluções tecnológicas e museográficas: o conhecimento produzido no âmbito do Cibermuseu constituirá uma categoria de acervo específica. Por exemplo: melhorias desenvolvidas em softwares; emuladores para tornar acessível algum arquivo desenvolvido em tecnologia descontinuada; soluções que promovam acessibilidade de pessoas com deficiência etc. Vislumbramos aqui a possibilidade do Cibermuseu contribuir para fomentar outras iniciativas na área.

Cada categoria de acervo será organizada por meio de coleções específicas, conforme sistema de documentação que será desenvolvido.

Enfim, a questão da política de aquisição de acervo é a única que pode ser proposta no estado atual em que nos encontramos. Outras questões surgirão a partir desta primeira definição.

Documentação

Na próxima página você terá uma breve referência sobre documentação museológica e os esforços para representação de informações em museus. Verá também dois exemplos de softwares livres que podem ser utilizados para gerenciar o acervo do Cibermuseu.